domingo, 28 de setembro de 2014

Meritocracia?






Há tempos, vejo se propagar discursos contrários aos programas de distribuição de renda, cotas raciais, acesso a bolsas de estudo pelo governo, enfim, os muitos programas sociais endeusados por uns e demonizados por outros. Vejo também discursos cada vez mais inflamados defendendo a meritocracia, pois muito bem, é dela que quero falar.



O mérito, o merecimento, sempre foi importante para qualquer pessoa ou grupo alcançar com sucesso algum objetivo de vida, mas não há que se falar em mérito, no caso específico brasileiro, quando historicamente não há igualdade de condições de competição.
Milhares de crianças e jovens, filhos das classes desfavorecidas de dinheiro, durante décadas, séculos, tiveram que competir em vestibulares da vida com os jovens de número minoritário que tiveram acesso não só ao melhor ensino, mas a melhor comida, a melhor roupa, aos melhores roteiros de viagem, enfim a uma melhor vida...então, esses mesmos jovens e seus defensores, por ver o número de vagas nas universidades públicas diminuírem por causa das cotas raciais e os programas de bolsas de estudos, lamentando que não se entra mais nas universidades através do merecimento, mas porque o governo ajuda.


Vejamos o seguinte fato: se nossos jovens, em toda a história do Brasil, não os de agora, tivessem acesso as mesmas condições de vida e portanto de estudo, seria justíssimo falar em mérito, mas como falar em meritocracia se existe um abismo que sempre separou esses grupos? Desigualdades sociais sempre existiram no mundo, mas a brasileira é generalizada e impeditiva, tipicamente arquitetada para quem está no estrato inferior nunca sair de lá e é aí que a escola pública de nível básico é ainda tão ruim, pois como fica a iniciativa privada a parcela de oferecer boas escolas de nível básico, quem tem mais acesso às melhores universidades? Aqueles que puderam ter mais acesso ao bem mais precioso de um povo, a educação.


Enquanto não forem oferecidas as mesmas condições de competição seja na escola ou em uma gincana de bairro, não há que se falar em meritocracia e sinceramente, quem a defende em condicionantes tão desiguais apenas quer maquiar seu discurso hipócrita de medo de uma concorrência na perda de privilégios históricos de uma pequena classe...

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

A gente não quer só comida...


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Soube com muita felicidade da notícia de que o Brasil saiu do mapa da fome. A ONU divulgou esta semana os números de pessoas que passavam fome no Brasil e que hoje tem o que comer. Vibrei, essa é a verdade, e vibrarei sempre...



Agora o desafio começa de verdade. Como nossos maiores problemas sociais sempre eram a miséria e a fome, hoje com a mudança de cenário, surge um grupo numeroso que quer mais que simplesmente se alimentar. Esse grupo que surge quer comer em restaurantes, quer passear, quer ir a teatros, frequentar casas de shows, quer estudar mais, quer aprender novos idiomas, quer finalmente caminhar pelas cidades em segurança.


Chamo isso de desafio porque o maior problema, a fome, como sendo resolvido, fez surgir um problema ainda maior, como adequar um nova população que está sedenta de bens e serviços que antes eram impensáveis...


Com os preços dos produtos vendidos no Brasil eles ainda estão excluídos, com os níveis de educação e saúde ainda deficitários e o transporte público ainda muito ineficientes surge para quem quer que governe, novas demandas, demandas por uma população que já não pensa mais em escapar da fome 24 horas por dia, mas como pagar a prestação do carro e como fazer com que orçamento deixe um dinheiro para aquela viagem à Gramado...é...crescer tem suas demandas mudadas e isso é maravilhoso, pois até a corrupção, nossa velha amiga de 500 anos, já não é tão bem vinda como antes...esse país está mudando? Eu digo com certeza, sim, e para melhor...

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Por que eles podem e nós não?





Recententemente venho tendo uma postura contemplativa em relação à algumas experiências de minha vida. Uma dessas experiências que mais me marcou foi a primeira viagem internacional. Era o ano de 2011. Estava em uma fase onde havia passado em um concurso público, estava começando uma vida nova, estava feliz e mais independente. Aproveitei a primavera na Europa e fui conhecer a França, lindo lugar realmente, mas ao contrário de muitas pessoas que viajam para um lugar tão bonito, não consegui fazer turismo.


 Em cada lugar que passava, via os monumentos, as calçadas, as pessoas, os problemas, os motivos que fizeram aquela terra ser do jeito que é e não conseguia parar de pensar no Brasil e em suas particularidades e complexidades. Essa primeira viagem me fez perceber que mesmo estando em um país considerado desenvolvido, de sua população ter uma renda mais alta que a nossa, e sua população ser mais bem educada, percebi que eles, os europeus, olham para nós da mesma maneira. 


Ah que país lindo onde vocês vivem, escutava de uns, que povo bonito e alegre, escutava de outros, vocês trabalham muito, escutei também, o seu país é muito rico, escutava de outros...também desmistifiquei muitas outras coisas que pensava não existir por lá...presenciei pessoas pedindo esmolas, cheiro forte de esgoto em Paris, estrangeiros vendendo falsificações das bolsas de marcas caríssimas, assaltantes, sucateamento gradativo dos direitos sociais e empobrecimento da população...e também um conflito social muito forte em relação à causa Árabe...um grave problema...mas também vi uma coisa que falta em nós e adoraria que a moda pegasse por aqui: o conceito de coisa pública, direitos coletivos, urbanização voltada para a coletividade e respeito ao patrimônio de todos...


Muitos se sentem felizes nos metrôs de Paris ou Nova Iorque, mas não conseguem utilizar o transporte público no Brasil ,pois é coisa de pobre. Outros, respeitam todas as civilizadas leis de trânsito da Suíça, também visitei, mas parar para o pedestre passar na faixa é tido como um grande favor...por que somos assim? Seria nossa tradição colonialista que nos traz no íntimo uma admiração pela cidadania desenvolvida na Europa, mas que nos sentimos desmerecedores dela? E afinal por que acreditamos que a cidadania aqui tem que ser aliada a dinheiro? E porque muitos em vez de tentar fazer de sua pátria mais civilizada e decente prefere ir embora para viver em um lar mais civilizado? 


Será que esses que assim pensam não sabem que os europeus são mais civilizados e mais organizados porque lutaram muito e se sacrificaram durante séculos e primeiramente se valorizaram para depois adquirirem o respeito do resto do mundo? Então...essa foi a maior lição que as viagens que fiz e faço me trouxeram...um entendimento de que problemas existem em qualquer lugar e que se quisermos nos valorizar e respeitar enquanto povo e nação, precisamos nos reconhecer, valorizar e nos unir para superar nossos problemas, como os europeus fizeram no passado e continuam fazendo hoje...

sábado, 13 de setembro de 2014

Religião e eleições




Observo ultimamente na reta final de campanha todo tipo de teatro. É candidato se fazendo de vítima de todo jeito...os honestíssimos, acima de qualquer suspeita, vendo seus telhados desabarem, outros, mais habituados, tirando de letra e outros agredindo para reverter posições ruins na reta final de campanha. 


O que dá para perceber é que alguns candidatos utilizam, de forma descarada a comoção, a vitimização e a religião para subir em pesquisas ou se recuperar de posições ruins...aí vem a pergunta: se o Estado é laico, por qual motivo a crença individual tem que ter tanta importância? Não deveria ter, mas tem. 


O Brasil é um país onde a sua população, quer seja católica, evangélica, espírita ou umbandista, professa uma fé. O povo brasileiro é religioso, sincrético, fervoroso e ainda não compreendeu a posição laica do Estado. Já ouvi diversas vezes candidatos convocando os seus fiéis conclamando "o povo de Deus" a votar em seus candidatos...sem a menor cerimônia...os padres católicos ultimamente estão aparentemente afastados da política partidária, visto a posição central da igreja determinar tal ato...porém, nos dias atuais, parece ser natural julgar este ou aquele candidato por ter esta ou aquela fé, ou ausência dela. 


Diante de tal cenário, cabe a pergunta: a fé, a religião, a preferência de crença e culto são fundamentais para os destinos de um estado, um país, uma cidade? Por acaso professar alguma fé ou nenhuma faz da pessoa melhor para governar? Talvez para muita gente faça, pois ainda se acredita que a religião faz de alguém melhor...ledo engano, pois se mata e expropria em diversos lugares do mundo em nome da fé...então pensemos bem na escolha dos candidatos e passemos a ter mais raciocínio e menos emoção na hora do voto, pois na questão governo, Deus vai sempre olhar por todos, os honestos, os corruptos, os competentes e os incompetentes também e ninguém é melhor por professar esta ou aquela fé.

sábado, 6 de setembro de 2014

Respeito?

Ultimamente venho observando a nossa fraca estrutura de cidadania no Brasil. O que noto é que infelizmente minha conclusão não está errada , muito pelo contrário, está absurdamente atual...não gostaria que estivesse, mas está. 


Vejo o tempo todo pais abandonando seus filhos para serem criados por jogos eletrônicos, programas de televisão, internet. Ouço também muitos falarem que trabalham muito para dar "uma boa estrutura" aos seus filhos...e por falar em estrutura, observo também que o termo estruturado em nossa sociedade equivale a ter bens. Não sou contra as crianças brincarem com jogos modernos ou terem acesso à informática cada vez mais cedo ou simplesmente as pessoas terem uma vida financeira estável, quero que melhore a cada dia, mas a solidez estrutural de uma pessoa não deve ser baseada em sua renda, pelo contrário, deve ser baseada nos conceitos de respeito, solidariedade, carinho, afeto, tolerância e dignidade, depois vem os bens materiais...


Noto que não é de hoje que nossa sociedade valoriza o ter em detrimento do ser e vemos complacentemente jovens com boas roupas, bom vocabulário, bem alimentados, sem a menor noção de respeito ao próximo e a si mesmo. Também não vejo jovens pobres que com o suor do seu trabalho conseguiram ascender socialmente e financeiramente muito diferentes desse lamentável padrão...estão no mesmo barco, também não vejo isso como privilégio dos jovens, também vejo pessoas idosas utilizarem do mesmo comportamento...o desrespeito está entranhado na nossa cultura, sempre esteve, não é atual...vem desde os primeiros colonizadores...


O que vejo com uma certa melancolia é que os valores no Brasil são invertidos, o honesto é idiota, o desonesto é o esperto, o grosseiro é o forte, o tranquilo é o covarde e as vias de diálogo são ínfimas...aliás, não existe diálogo entre as famílias, antes era devido ao autoritarismo reinante, hoje a batalha é perdida para os jogos eletrônicos...vejo também com imensa tristeza pessoas idosas que vieram da mais absoluta miséria e melhoraram consideravelmente sua vida financeira agir de forma tão primitiva, pois se casam, o comportamento é de quem não casou, se tem filhos estes não são respeitados, as esposas então...mas mesmo assim formam família...deixando um rastro de dor e sofrimento...


Isso nunca acabará enquanto a nossa sociedade primeiramente,não cuidar da base, do respeito ao próximo, da ética na vida pública e do valor do ser humano enquanto cidadão e depois cuidar das finanças, pois só assim tanto o ser humano, quanto suas finanças serão melhor geridos para uma vida melhor, uma sociedade melhor, um mundo melhor...